quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Passos trocados

As férias chegam e o tempo se torna mais livre. Posso escrever. A chuva vem para lavar o ano que acaba, espero que tenhamos novamente dias de sol.

Eu tenho pressa
E tanta coisa me interessa
Mas nada tanto assim
(Nada tanto assim - Kid Abelha)


- É preciso se implicar com a vida. A nossa . Problematizar o vivido. Ocupar-se não é se implicar. O que foi construído? O que você fez? Mais uma vez te digo: viver não é cumprir agenda!

Disse, ou melhor, escreveu e cantou certa vez o poeta-diplomata Vinícius de Moraes que a vida é a arte do encontro. Até hoje, não conheço expressão melhor que possa sintetizar de modo mais adequado o que é viver. Viver é encontrar e desencontrar, portanto somos marcados por presenças...viver é reconhecer Presenças. Presença, com 'p' humildemente maiúsculo. Presente. Impacto das presenças que se chocam conosco e nos permitem perguntar quem somos, para onde vamos e para que servimos. Nossa essência, nosso destino e nossa vocação.
No entanto, me assusto com o poder de pequenos encontros que, além de nos marcarem, nos fazem refletir ou ao menos olhar a vida com olhos mais lúcidos. Pequenos momentos de epifania cotidiana. Presenças que nos mobilizam ora porque somos impactados, ora porque precisamos mudar de lugar, já que não conseguimos ver bem de onde estamos. O local de onde vemos se torna insuficiente, não é o bastante. Sinto-me incomodado também quando me pergunto em quais momentos sou presença para os outros e não encontro (ironicamente) resposta.
Para participarmos de um encontro é preciso ser. Ser presente. Sê inteiro. Vivemos e (viveremos) por muito tempo no dilema entre ser e ter, já que nem sempre é fácil existir. Estamos impregnados pela lógica do ter e do saber: sabemos ou temos algo e nos expressamos – alguns mais, outros menos - como se isto nos bastasse para viver. E quando não temos, nos ocupamos a fim de nos valorizarmos enquanto mercadorias, como diria alguém que pouco conheço. Atualmente, somos mercadorias que nos criamos e não sabemos se haverá mercado para produtos cada vez mais sofisticados. Viajados, poliglotas, polivalentes. Gastamos tempo demais nos fazendo. O sentido real se perde no dia-a-dia. Podemos ficar encalhados nas prateleiras e ninguém nos encontrar. Nem nós mesmos.
Podem dizer que o argumento é pessimista e que aponta para uma situação que, possivelmente, difícil de ser superada. Nem sempre é simples ser o que se deseja ser e colocar-se próximo... persiste o 'temor' de não ser aquilo que se espera. É preciso aprender olhar para si, sem egoísmos.
Às vezes, há vontade de largar tudo. A arte também pode nos permitir encontro conosco mesmos...nos levar a mexer em caixas do passado e nos desprender de amarras com o antigo e tentar encontrar o novo. Ainda que ele ainda não tenha rosto, gosto ou nome. É encontrado pelo cheiro, pelo faro. Pelo tato.

É presença que nos traz saudade daquilo que não fomos e daquilo que não mais poderemos ser. Cheiro de terra. Saudade do meu lugar.

A vida é arte do encontro
Embora haja tanto desencontro pela vida
( Samba da Benção – Vinícius de Moraes)

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Um presente


Esse texto não é meu. É um presente de minha amiga, Maria Fernanda. Um presente em São João.
"Articular: Que pertence as articulações (Gramática). Que é de natureza do artigo. V.t. unir pelas articulações, ligar, pronunciar.
Reticular ou reticulado: Que tem forma de rede.
Portanto: Articulações Reticulares é uma prática de pessoas sãs.
Porque? Porque deve-se fazer o que se há de maneira ligada? Em forma de rede?
Porque não desunir?
Porque o ato de desorganizar, de pronunciar sem coerência, sem preocupação é típico dos loucos. Mas o que é um louco senão uma pessoa que brinca, que cria seu próprio universo, que mostra suas emoções, que expõe sentimentos, que não se deixa ser reticulado.
Como disse Rita Lee: Dizem que sou louco, por pensar assim... .A loucura é a constante busca pela paz, pela libertação. Como caracterizar um louco? Aquele que ri sem medidas, que chora sem vergonha, que fala sem censura, que sente sem razão.
Pronto. Está caracterizado um louco. Eu. Louco por querer amar demais, por sorrir demais, por chorar demais, pra falar demais. Mas é essa loucura que me faz feliz. Que me torna transparente o suficiente para que todos saibam quando algo não está legal.
LOUCA. Louca por desconstruir, por descontrair. A começar por aqui. Desconstruo o que fez o criador. Ele queria que fosse tudo organizado, articulado, psicologizado (existe essa forma ou mesmo essa palavra?).
Eu não. Que quis que tudo fosse espontâneo, desalinhado, letrado (diz-se daquele que é versado em letras, erudito, literato segundo Silveira Bueno). Para mim não. Letrado é o que estuda Letras. Doido, maluco, pirado. Aquele que busca para o resto dos dias, descobrir a essência das palavras, brincar com elas, combiná-las decifrá-las. Louco? Claro. Nem o mais sábio dos homens conquistou tal mérito, as palavras. O louco sim. O louco as cria, as articula de maneira que ele considera reticular, que ele entende como sentido. Ele exterioriza sentimentos.
Nisso, o fiz. Nada de sentido no que coloquei. Porque quis apenas exteriorizar para não enlouquecer cada vez mais e tentar articular reticularmente o que sinto. Não daria certo nem faria sentido à minha natureza."
Obrigado, Maria.


Ele vem.